Ensaboou respeitando meu axé! Viradouro e Grande Rio pulam na frente na briga pelo título

Agremiações de Niterói e Caxias fazem apresentações quase perfeitas; Mangueira e Portela ficam na média; Ilha, Estácio e Tuiuti se complicam

 

Em uma noite que praticamente todas as agremiações tiveram algum tipo de problema na passagem pela Marquês de Sapucaí, Viradouro e Grande Rio saíram na frente na luta pelo título de campeã do Carnaval 2020. Com apresentações arrebatadoras e que conquistaram as arquibancadas do Sambódromo, ambas as escolas prometem brigar ponto a ponto pelo título na apuração da próxima quarta, mesmo com o problema de iluminação da Viradouro em uma das alegorias e com o buraco causado pelo atraso na entrada de uma das alegorias no primeiro setor do desfile.

 

O equilíbrio que se nota nas escolas que brigam pelo campeonato se repetiu com as outras cinco agremiações que passaram pelo Sambódromo. Mangueira e Portela fizeram passagens recheadas de falhas que devem tirar as duas mais antigas escolas da briga pelo título, mas ainda terão boas chances de voltar no desfile das campeãs. Equilíbrio também visto entre aquelas escolas que devem ficar na parte de baixo da tabela como foi o caso de Estácio de Sá e União da Ilha.

 

ESTÁCIO DE SÁ

Com enredo sobre pedras desenvolvido pela carnavalesca Rosa Magalhães, a escola do Morro de São Carlos abriu a primeira noite de apresentações do Grupo Especial de maneira digna, com destaque para algumas alegorias que chamaram atenção pelo capricho na concepção, marca registrada da carnavalesca, apesar das graves falhas de execução com acabamento deixando muito a desejar. A apresentação foi bastante irregular. O andamento do samba extremamente acelerado causou problemas de harmonia e evolução e podem prejudicar a permanência da agremiação na elite do carnaval carioca. Aliás, durante toda a apresentação, na primeira frase do refrão principal houve um deslocamento da sílaba tônica da palavra “poder” o que certamente acarretará perda de pontos em quesitos como harmonia e samba-enredo.

 

UNIDOS DO VIRADOURO

Atual vice-campeã do carnaval carioca, a Unidos do Viradouro, assim como em 2019, teve a ingrata missão de ser a segunda escola a passar pela Sapucaí neste domingo de carnaval. Disposta a quebrar o tabu, a Vermelha e Branca de Niterói pisou na Passarela do Samba e mostrou que quem quiser ser campeã terá que superar sua belíssima apresentação. Mesmo com um problema elétrico em uma das alegorias, que passou apagada durante boa parte do desfile, a passagem mostrou acabamento perfeito nas luxuosas fantasias e alegorias desenvolvidas pelos carnavalescos Marcus Ferreira e Tarcísio Zanon. A comissão de frente levou as arquibancadas ao delírio quando uma das dançarinas que encenavam as Ganhadeiras de Itapuã, tema do enredo da agremiação, se transformava em uma sereia dentro de um aquário gigante.

 

O casal de mestre-sala e porta-bandeira, Rute e Julinho, retomou o espírito de seus melhores anos de entrosamento e defenderam o pavilhão encarnado de maneira sublime. Outro ponto alto da apresentação foi o entrosamento espetacular entre o intérprete oficial Zé Paulo Sierra e a bateria Furacão Vermelho e Branco, comandada por Mestre Ciça. Os ritmistas causaram frisson por todos os setores que passaram na Avenida. As bossas e paradinhas, especialmente aquela que percursionistas eram elevados em uma plataforma tocando atabaques sacudiu as arquibancadas. Confirmando o favoritismo do pré-carnaval, a escola de Niterói, mesmo sendo apenas a segunda a passar pela Sapucaí é uma das fortes candidatas a conquistar o campeonato que não alcança desde o histórico título de 1997.

 

ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA

Se tem uma coisa que não falta no atual casamento da Estação Primeira de Mangueira com o carnavalesco Leandro Vieira é a expectativa de uma apresentação impactante. Assim, a atual campeã do carnaval pisou na Avenida para buscar o bicampeonato que não conquista desde a década de 80 com um enredo que contou a vida de Jesus Cristo. Mas não o Cristo loiro, europeu, que aparece no imaginário, nas imagens sacras e na maioria dos livros de história. O Jesus da Mangueira foi apresentado como um morador do morro, igual a milhares de crianças, adolescentes e homens que habitam as comunidades carentes de todo país.

 

Se não bastasse ver o Cristo do morro tomar uma dura de policiais militares na fantástica apresentação da comissão de frente, onde tirava selfies e dançava nos bailes funk da comunidade, a Verde e Rosa trouxe para Marquês de Sapucaí uma das maiores imagens da história do carnaval. O Cristo crucificado, com o corpo cravejado de tiros, o cabelo descolorido e raspado, como de moradores do morro da Mangueira, é um instrumento que será capaz de fazer sair dos porões da discriminação os mais distintos preconceitos sociais que dominam nossa terra desde sempre. Porém, a apresentação da escola deixou a desejar. Especialmente nas fantasias da primeira metade do desfile. O gigantismo dos figurinos transformou a Marquês de Sapucaí em uma penumbra, o que prejudicou muito as chances de conquistar o sonhado bicampeonato.

 

PARAÍSO DO TUIUTÍ

Depois do vice-campeonato em 2018, a Tuiuti não teve a mesma sorte ano passado quando ficou fora do desfile das campeãs. A agremiação entrou na Marquês de Sapucaí para tentar reconquistar uma boa colocação e se firmar como uma das grandes do carnaval. Com um enredo sobre São Sebastião e com a boa passagem do carro de som comandado por Celsinho Mody e Nino do Milênio a Azul e Amarela de São Cristóvão pecou em boa parte da apresentação. A passagem começou com uma apresentação mediana da comissão de frente, com alegorias e fantasias que deixaram a desejar no acabamento. Esses problemas, aliados as falhas de evolução e harmonia devem comprometer o sonho da Tuiuti de se retornar ao desfile das campeãs.

 

GRANDE RIO

Com um grito de tolerância, clamando pelo respeito a todas as religiões, a Grande Rio pisou na Avenida disposta a mostrar que está resgatando o espírito de seus melhores dias. Com um enredo sobre Joãozinho da Gomeia, desenvolvido pela jovem dupla de carnavalescos Leonardo Bora e Gabriel Haddad, a tricolor de Caxias fez uma apresentação espetacular. Com uma plástica pesada, como o tema da escola pedia, as alegorias e fantasias chamaram atenção pela concepção, apesar da escala cromática deixar um pouco a desejar. Se um problema na entrada de um dos carros no início do desfie pode tirar pontos preciosos da escola na quarta de cinzas, o restante da apresentação foi praticamente perfeita. Desde a comissão de frente, comandada com maestria por Hélio e Beth Benjani, até a desenvoltura do casal de mestre-sala e porta-bandeira, Daniel Werneck e Taciana Couto.

 

O ponto alto da passagem da escola de Caxias se deu na parte musical do desfile. Como ficou claro no período de pré-carnaval, todos desconfiavam que o samba da Grande Rio seria um dos grandes hits do ano na Sapucaí. Porém, a passagem da agremiação mostrou um pouco mais que isso. O jovem intérprete oficial, Evandro Mallandro, estava em uma noite iluminada, assim como a bateria de Mestre Fafá. Os ritmistas de Duque de Caxias fizeram uma apresentação sublime, colocando o andamento do samba em um ritmo confortável para os componentes cantarem e se divertirem sem sobressaltos. Em época de sambas acelerados e baterias “metralhadoras”, os comandados de Fafá deram uma verdadeira aula de ritmo e cadência em uma apresentação que beirou a perfeição em todos os sentidos, desde as bossas e paradinhas perfeitamente encaixadas na melodia do samba, até a harmonia entre os naipes de instrumentos que se completavam maravilhosamente. Foi emocionante. Respeitando seu amém e pedindo respeito ao seu axé, a Grande Rio entrou com tudo na briga pelo tão sonhado título de campeã do carnaval que já bateu na trave tantas vezes.

 

UNIÃO DA ILHA DO GOVERNADOR

Um desfile controverso. Com um enredo que se propôs a fazer uma enorme crítica social na Avenida, como vem sendo a proposta de Laíla, diretor de carnaval que assumiu o comando da Ilha depois de uma passagem controversa pela Unidos Tijuca, a agremiação insulana deixou muito a desejar na passagem pela Marquês de Sapucaí. Tentando repetir a fórmula que deu certo no campeonato da Beija-Flor, em 2018, a tricolor insulana trouxe para a Avenida cenas pesadas de violência gratuita que não condizem com o espírito ancestral formador das premissas de um desfile de escola de samba. Como se não bastasse o mau gosto no desenvolvimento do enredo, a escola deslizou em vários quesitos como harmonia, evolução e comissão de frente. Mesmo com o esforço do premiado intérprete Ito Melodia, o samba de enredo não teve bom rendimento e deixou a apresentação tão frágil quanto o desenvolvimento do enredo. Não será surpreendente se depois de uma década entre as grandes do carnaval do Rio de Janeiro, a União da Ilha for rebaixada na quarta-feira de cinzas. O que seria uma tragédia para a querida agremiação, segunda escola de quase todo carioca, mas que, ao menos, serviria para sepultar esse estilo de desenredo e não-carnaval apresentado pela escola. Existem limites entre o lúdico e a realidade que não podem ser ultrapassados.

 

PORTELA

O dia despontava no horizonte quando a Portela entrou na Marquês de Sapucaí. Com o desfile assinado pelos carnavalescos Renato Lage e Márcia Lavia, a Azul e Branco de Madureira levou para a Avenida um dos mais belos conjuntos de alegoria e fantasias que passaram pela Passarela do Samba na primeira noite de desfiles do Grupo Especial. A palheta de cores utilizada pelos carnavalescos em tons de cores cítricas para combinar com o amanhecer causaram um efeito visual deslumbrante, assim como a águia, símbolo da escola, construída com estruturas sobrepostas e decorada com neon, no melhor estilo Renato Lage. Aliás, o segundo carro com índios envoltos com luzes de neon representando o sol e a lua foi, certamente, uma das melhores alegorias que cruzaram o Sambódromo nesse primeiro dia.

 

O carro de som comandado por Gilsinho e a bateria de Mestre Nilo Sérgio também tiveram excelente rendimento. Porém, problemas na concepção e na execução da Comissão de frente, comandada por Carlinhos de Jesus, podem tirar pontos importantes da escola na apuração. Assim como a ousada apresentação do casal de mestre-sala e porta-bandeira, Marlon Lamar e Lucinha Nobre, onde simulavam o nascimento de um bebê indígena. Em determinado momento, o mestre-sala tocava na roupa da porta-bandeira, o que é considerado por muitos julgadores tradicionalistas como um erro imperdoável que costuma acarretar perdas importantes de décimos.

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